SOCIEDADE PRECISA SE MOBILIZAR PARA A COP 17

17/02/2011 11:09

 

A Reunião do Clima, conhecida como COP 16, realizada em 2010, no México, ficou longe de seu objetivo maior, estabelecer um pacto mundial a respeito do clima a partir de 2012. Obter um compromisso de 194 países na contenção dos gases do efeito estufa, em especial o dióxido de carbono (CO2) proveniente de combustíveis fósseis, como o carvão e o petróleo, é a missão que se renova para a COP 17, que acontecerá na cidade de Durban (África do Sul), no final de novembro e início dezembro de 2011.

Por isso, “a mobilização das pessoas no mundo todo é de grande importância. Afinal, quanto maior o interesse da sociedade na questão, mais os líderes mundiais dedicarão tempo ao tema. Porém, esse movimento precisa ser iniciado agora, não nas vésperas da COP, visto que as negociações já estão em curso”, alerta André Ferretti, engenheiro florestal da Fundação O Boticário e coordenador do Observatório do Clima.

O especialista não tem dúvidas da “urgente” necessidade de um acordo global de clima “robusto” que garanta um futuro mais seguro ao Planeta. Contudo, Ferretti lembra que “a presença dos líderes mundiais na COP não é uma garantia de sucesso, como mostrou a COP 15”. Embora reconheça que se trata de um fator político importante, “pode até atrapalhar as negociações na medida em que diplomatas e técnicos experientes acabam perdendo espaço para lideranças que em grande parte não conhecem profundamente o tema e os textos em negociação”.

Com experiência no tema, pois André Ferretti acompanhou de perto as duas últimas reuniões, que aconteceram na Dinamarca e no México, ele não descarta a importância do envolvimento dos líderes mundiais, “incentivando e cobrando avanços e resultados de seus diplomatas e técnicos não apenas na COP, mas durante todas as reuniões que a antecede”.

Para o especialista mesmo que na COP de Durban não se chegue a um “novo acordo de clima”, uma série de questões técnicas serão enfrentadas e há possibilidade de avanços em vários temas como, o fundo para adaptação e mitigação para os países em desenvolvimento (Fundo Verde), e o aperfeiçoamento do mecanismo de REDD (redução de emissões por desmatamento e degradação) aprovado na COP 16. Veja a entrevista que André Ferretti concedeu ao Observatório Eco com exclusividade.

Observatório Eco: Com o avanço tecnológico nas pesquisas sobre as mudanças climáticas, o que de novo se revela nesse panorama e que mais preocupa você que é um estudioso do tema?

André Ferretti: A cada ano que passa, aumenta a certeza de que estamos vivendo um período de aquecimento global e, mais do que isso, que o ser humano é o principal responsável por isso.

Alguns cientistas – a minoria deles – concordam que o planeta está esquentando, mas não que isso esteja sendo provocado por ações antrópicas. Eles defendem a tese de que isso se deve a questões naturais como o aumento da atividade solar e redução do albedo planetário, este último devido à redução da atividade vulcânica.

Alguns poucos cientistas, inclusive, defendem que estamos num período de resfriamento global! Na ciência a unanimidade é quase impossível, e o debate entre os cientistas é um importante indutor de desenvolvimento científico. O que tem sido visto nas últimas duas décadas é um crescente debate científico sobre o tema, principalmente depois da criação do IPCC (sigla em inglês do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas).

Ao passo que as lideranças globais não conseguem entrar em acordo para reduzir significativamente as emissões de gases de efeito estufa para que a sociedade não seja afetada por essas previsões, a cada dia sentimos mais os efeitos dessas mudanças. Muito pouco tem sido feito na questão de adaptação às mudanças, gerando grandes impactos sociais, econômicos e ambientais.

Uma mostra disso são as intensas chuvas que atingiram o Brasil nos últimos anos, afetando principalmente os estados do sul, sudeste e nordeste. Não se pode afirmar que foram causados pelas mudanças climáticas, porém as modelagens climáticas indicam que eventos climáticos extremos como esses, serão cada vez mais freqüentes.

Observatório Eco: Existe um alerta do IPCC de que as populações pobres são as mais vulneráveis das variações climáticas, mas isso não parece motivar os países ricos a atuarem de forma mais efetiva nas negociações. Por outro lado, as variações climáticas ocorreram na Europa, na Austrália, EUA, ou seja, esses países não percebem que são vítimas do clima?  Não está na hora de inverter esse jogo? Todos são vulneráveis, ricos e pobres?

André Ferretti: As mudanças climáticas afetam todo o globo, mas quando o IPCC alerta que as populações pobres são as mais vulneráveis está se referindo ao fato de que geralmente essas populações dependem mais dos recursos naturais para sobrevier (extrativismo animal e vegetal, agricultura de subsistência, etc.) – recursos esses que podem ser severamente afetados por eventos climáticos extremos como secas, enchentes e furacões; muitas vezes habitam regiões mais vulneráveis às grandes intempéries (regiões áridas ou semi-áridas, encostas íngremes, margens de rios, lagos, mares e mangues, etc.); vivem em moradias mais frágeis e mais sujeitas a danos severos causados por eventos climáticos extremos (casas de palha ou pau-a-pique, por exemplo); e tem menos recursos financeiros para mudar, reconstruir ou reformar suas habitações ou fonte de renda.

Os países desenvolvidos também sofrem as conseqüências das mudanças climáticas, mas por outro lado dispõem de melhores condições para prevenir, mitigar ou adaptar-se aos impactos das mudanças climáticas. Isso não os isenta de mapear suas regiões e populações mais vulneráveis e implementar planos de ação para adaptação. Países inteiros como a Holanda, ou cidades importantes como Veneza, por exemplo, são muito vulneráveis à elevação do nível do mar. Uma elevação de poucos centímetros pode causar sérios danos a essas regiões e suas populações.

Todos precisam investir em adaptação, ricos ou pobres, de áreas mais ou menos vulneráveis. Metrópoles como São Paulo, que sofrem pela ocupação mal planejada do seu território e excesso de impermeabilização do solo, são cada vez mais vulneráveis a grandes enchentes, assim como pequenas cidades das regiões serranas do sudeste, sujeitas a grandes trombas d’água e deslizamentos de terra devido ao relevo acentuado, e regiões do sertão nordestino ou da Amazônia ainda pouco povoadas com a maior parte do território coberto por vegetação natural que da mesma forma são vulneráveis a grande s enchentes ou secas.

O mundo precisa com a máxima urgência reduzir as emissões de gases de efeito estufa para diminuir os riscos futuros previstos pelos cientistas, bem como ampliar a cooperação internacional para previsão e alerta de eventos climáticos extremos e adaptação às mudanças já em curso.

O Fundo Verde, aprovado na COP 16 pode ser um começo, mas ainda é muito pouco e perto do que é necessário. Ainda mais urgente é a necessidade de um acordo global de clima robusto para que possamos ter um futuro mais seguro.

Observatório Eco: Considerando os resultados das reuniões do clima na Dinamarca e no México, quais os desafios da COP 17?

André Ferretti: O maior de todos os desafios continua sendo o de firmar um acordo global de clima vinculante, ou seja, com compromissos formais de redução de emissões para os países membros da Convenção do Clima, para vigorar após 31/12/2012, quando termina o primeiro período de compromisso do Protocolo de Quioto. Discute-se desde a ampliação de Quioto por mais alguns anos, quanto a elaboração de um acordo totalmente novo.

Independente disso, outra grande questão a ser equacionada é a participação, no novo acordo, de todos os 194 países membros da Convenção. As realidades desses países são muito distintas, mas é fundamental que todos façam parte do acordo, independentemente das suas responsabilidades históricas perante o problema.

A COP 17, a ser realizada em Durban, na África do Sul, no final de novembro e início dezembro de 2011. É importante destacar que a COP é o evento final de um ano marcado por várias reuniões de negociação dos países membros da Convenção do Clima da ONU, e que o seu sucesso ou fracasso depende muito desses passos intermediários.

Mesmo que a COP de Durban não se chegue a um novo acordo de clima, uma série de questões técnicas, ainda, deverá ser definida no que se refere a questões importantes como o fundo para adaptação e mitigação para os países em desenvolvimento (Fundo Verde), que emergencialmente disponibilizará US$ 30 bilhões até 2012 e tem a intenção de captar até US$ 100 bilhões até 2020; o mecanismo de REDD (redução de emissões por desmatamento e degradação), aprovado na COP16 com pré-requisitos, chamados de salvaguardas, que visam a garantir que os projetos de REDD elegíveis no âmbito das Nações Unidas respeitem os direitos de povos indígenas e comunidades locais, e a biodiversidade.

Observatório Eco: Em sua opinião, a mídia e as ONGs devem se mobilizar como fizeram com a COP 15, para que a COP 17 se torne o centro das atenções, e leve os líderes mundiais às reuniões? Isso seria benéfico nas negociações, ou é melhor uma reunião apenas com os representantes técnicos, à exemplo do México?   

André Ferretti: A mobilização das pessoas no mundo todo é de grande importância. Afinal, quanto maior o interesse da sociedade na questão, mais os líderes mundiais dedicarão tempo ao tema. Porém, esse movimento precisa ser iniciado agora, não nas vésperas da COP, visto que as negociações já estão em curso. O sucesso da COP vai sendo construído ao longo do ano pelas dezenas de eventos oficiais da Convenção do Clima.

A presença dos líderes mundiais na COP não é uma garantia de sucesso, como mostrou a COP 15. Certamente é um fato político importante, mas pode até atrapalhar as negociações na medida em que diplomatas e técnicos experientes acabam perdendo espaço para lideranças que em grande parte não conhecem profundamente o tema e os textos em negociação.

O mais importante é que os líderes mundiais estejam sim envolvidos profundamente com esse importante desafio o tempo todo, incentivando e cobrando avanços e resultados de seus diplomatas e técnicos não apenas na COP, mas durante todas as reuniões que a antecede.

Por Roseli Ribeiro

Observatório Eco