RAFTING NO RIO DO SACO

20/01/2012 23:02

 

Por Lucélio Costa

Traquinagens são coisas pertinentes aos meninos e por esse bom motivo, as fiz, muitas e muitas vezes, afinal assim não fosse o que teria agora para contar. Claro, não direi todas, é impossível relatá-las. Vou dizer da imaginável viagem que pretendia fazer sempre que o Rio do Saco, esse  que corta a cidade de Paty do Alferes transbordava no período das chuvas. Observando isso, muitas vezes pensei que seria uma ótima forma de conhecer o mar, já que todas  as àguas correm para o mar. Certo dia que as àguas do pequeno rio subiu, aproveitei e cortei vários pés de bananeiras cultivadas pelo meu avô para transformá-las em uma jangada e descer o rio até seu encontro com o mar. Não consegui, fui descoberto antes de me lançar às águas, que frustração e que surra! Não reclamo, mereci, poderia não esta aqui hoje caso não fosse impedido naquele momento. Mas tarde tive conhecimento mais que algumas pessoas tinham se afogado devido à violência das águas.

Sei que aquele projeto não teria nenhuma chance de navegação, era preciso algo, mas estruturado, algo que me garantisse algumas batidas laterais e não fosse a pique facilmente. Teria eu mais tempo para pensar, sabiam que períodos de chuvas viriam outra vez e até lá novas tecnologias deveriam despontar, e assim fazer uma viagem mais segura. Foi quando tive a ideia genial, um invento dos mais avançado da época; metal leve, boiava tal como uma pluma, ergonômico, fácil manejo, com possibilidade de refletir muita luz e o melhor ainda; já se encontrava praticamente ancorado na borda do rio; era só entrar e sair navegando.

Aqueles dias de espera foram os mais demorados, parecia que as chuvas não queriam cair naquele ano, minha embarcação não poderia ser usada por outras pessoas, não a queria com amassados ou arranhões, mas tive que esperar. Foram longas noites de ansiedade, a qualquer ventinho já me preparava e me enchia de coragem para o tão esperado momento.

Até que um belo dia veio às chuvas, parecia que tudo ia encher d’água, era estrondos horríveis, relâmpagos e as árvores se quebrando por todo o quintal. Deitado pensava onde estará o nível do rio? será que subiu muito? Será que minha embarcação estava lá fora? Pois tinha receio de que ela não suportasse a força das águas e a qualquer momento pudesse ir embora rio abaixo, logo me acalmava, não...ainda não! Ela está muito acima do rio, até onde ela está são uns quinze metros de altura e jamais teve uma enchente tão grande assim.

De pensamento em pensamento a noite passou, ao amanhecer espiei pela brecha da janela um raio de sol tímido, mas ouvi também que um barulho estranho se fazia perceber bem perto da mesma janela, o que poderia ter acontecido? Alguma enxurrada ainda corria por ali?! Levantei-me de mansinho, pé por pé, e para espanto vi que as águas do rio já estava quase alcançando nossa porta dos fundos, faltava apenas alguns degraus.

Aquele pequeno rio tinha se transformado em um gigante curso de água barrenta, dos seus cinco metros de largura, ele foi para uns cinquenta metros. Violento, arrastava tudo que se apresentasse em sua frente, uma fúria sem igual, confesso que tive medo, achei mesmo que ele iria nos arrastar com casa e tudo, foi quando ouvi outro barulho que imterropeu os meus pensamentos, esse sim, era de dar muito medo;

- “Não quero ninguém lá fora hoje, as portas estaram trancadas por todo o dia, esse rio está perigoso e além disso, as cobras estão ao redor da casa”.

Palavras da minha avó, que sentenciou as minhas pretensões, acabando com as minhas esperanças naquele momento, de inaugurar minha “ Nave Prateada Flutuante”, só me restava aguardar, aguardar e aguardar.

 
No dia seguinte, as águas baixaram alguns metros, mas mesmo assim, ainda era muito forte a correnteza, e toda a atenção dos meus superiores hierárquicos; avós, tias e tios, estavam voltadas para nós, os subalternos e inconsequentes marujos.

Mas quem é persistente não se dobra fácil, eu aproveitei uma falha na guarda, saí de fininho em direção a “Nave Prateada” e num piscar de olhos me vi embarcado. Num pequeno impulso me coloquei  ao meio da correnteza, mas, senti que algo estava errado, não era assim que eu tinha planejado, perdi o comando da minha nave prateada, ela girava como um pião descontrolado.

Medo e pavor, só me restava botar a boca no mundo e gritar, a cada rodopio da minha nave via de relance os meus tios desesperados a correr e gritando por ajuda dos vizinhos de um lado e do outro, para que me salvassem. De repente era uma multidão a correr as margens do rio na tentativa de me alcançarem, o que se deu à quase dois kilômetros rio abaixo, num estreitamento do rio, entre uma pedra do leito. O meu tio jogou uma corda que prontamente alcancei e fui retirado das águas. Aliviado, vi a minha nave prateada flutuante toda amassada indo água abaixo, e lá se foi  a “Bacia de Alumínio” de minha querida avó.

Duplamente sortudo desta vez não apanhei, só fui advertido carinhosamente por todos. Afinal, estava eu alí sã e salvo, para nunca mais esquecer este dia que fiz rafting no Rio do Saco e quase fui pra o saco.

Lucélio Costa – Carioca de nascimento, Cidadão Cuiabano, Bacharel em Direito, Pós Graduado em Direito Agro-ambiental, Professor de Judô, Compositor, Ambientalista, Membro da Ong Garra